Nota de Conjuntura #29: Não há diferença entre democratas e republicanos
A desistência de Joe Biden de concorrer à presidência dos Estados Unidos abriu caminho para a atual vice, Kamala Harris, substituí-lo na corrida presidencial. O anúncio provocou alvoroço nos setores liberais da esquerda brasileira. Numa mistura de falta de noção básica de realismo político, abandono do conceito de imperialismo como categoria central de análise e ilusão com uma suposta representatividade de gênero e etnia, algumas de suas personalidades saudaram efusivamente a potencial candidatura de Kamala. Tudo feito em nome de se combater a extrema-direita, definida como um mal maior que justificaria toda sorte de frente ampla.
Não se ignora a ascensão de uma extrema-direita articulada a nível mundial. E Trump nos Estados Unidos é sua representação. Porém, vença quem vencer a eleição norte-americana, seja o republicano Trump ou a democrata Kamala, será eleito um presidente, ou uma presidenta, de uma potência imperialista. E governarão tendo por prioridade atender os interesses de seus oligopólios financeiros. Não existe diferença essencial entre ambos, a não ser formas cosméticas de exercer o domínio imperialista sobre o mundo. Quando esses interesses estão em jogo, democratas agem de modo tão violento como os republicanos.
Importante lembrar os desmemoriados que o golpe contra Dilma se deu sob o governo do democrata Barack Obama. E a Operação Lava Jato tocada por Sérgio Moro, que mandou Lula para a cadeia e o impediu de se candidatar à presidência em 2018, deixando o caminho aberto para a eleição de Bolsonaro, foi um jogo combinado com o Departamento de Estado dos gringos. O resultado, como sabemos, foi a destruição da economia nacional e do tecido social brasileiro.
Em seus movimentos mais recentes foi o governo democrata de Obama, cuja secretária de Estado era Hillary Clinton, quem apoiou um golpe que destruiu o Estado nacional líbio e afundou a Síria em uma guerra contra o Estado Islâmico, apoiado pelos Estados Unidos. Atualmente é com apoio de um governo democrata que ocorre a olhos vistos o genocídio do povo palestino. O número de mortos diretamente pelos bombardeios e indiretamente com o bloqueio à entrada de ajuda humanitária, ao provocar fome e surtos de doenças, já pode ter atingido mais de 180 mil pessoas em Gaza.
Não cabe a esquerda brasileira entrar nessa disputa, como se estivesse em jogo o destino do nosso país. Não somos eleitores nos Estados Unidos, ainda que as políticas dos diferentes governos que passam pela Casa Branca nos afetem. Sem dúvida que há um perigo na ascensão da extrema-direita. Mas o inimigo central é a permanência do ajuste ultraliberal. Seus beneficiários são o imperialismo e as burguesias nacionais pró-imperialistas dos países periféricos. E sua aplicação não escolhe tintura partidária, com governos de partidos ditos progressistas e socialdemocratas aderindo a essa agenda. É a destruição do tecido social causada pelo ultraliberalismo, apoiada pela ingerência imperialista, quem alimenta o discurso demagógico da extrema-direita. Inclusive nos Estados Unidos, cuja classe trabalhadora também assiste a uma profunda deterioração em suas condições de vida.
Cabe verdadeiramente à esquerda brasileira, e aos comunistas em particular, a tarefa há muito abandonada de organizar as massas trabalhadoras em torno de um projeto de orientação socialista que afirme em fatos, e não em discursos, a completa soberania nacional: alimentar, econômica, tecnológica, industrial, política, cultural e militar. A maior salvaguarda a influência nefasta do extremismo de direita é a realização de mudanças políticas e econômicas que derrotem o ajuste ultraliberal.
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